Compliance Trabalhista: Conformidade e sustentabilidade empresarial para reduzir riscos trabalhistas.
Por que o Compliance está sendo adotado no meio Corporativo?
Empresas cuja visão de negócio é desenvolvida sob o olhar da ética e da integridade são empresas prósperas. E caminham para garantir a sustentabilidade dos seus negócios numa perspectiva a longo prazo. Aprendi isso em quase 30 anos de advocacia trabalhista.
Também aprendi que há um meio de reduzir a vulnerabilidade de uma empresa ap passivo trabalhista. É preciso ter um plano preventivo ativo, com práticas corporativas modernas e monitoramento constante na área jurídica trabalhista e na de recursos humanos. E esse plano passa pelo engajamento dos colaboradores com a missões e valores da empresa.
As empresas deveriam compreender que um Programa do Compliance Trabalhista promove a união do universo das leis com a sistemática das decisões judiciais para o fomento de processos de conformidade legal e de uma boa governança corporativa. E o que é o Compliance?
Para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o Compliance é um conjunto de medidas internas e externas que previne ou minimizar os riscos de violação às leis decorrentes de atividade praticada por um agente econômico e de qualquer um dos seus sócios. [1]
Já Pinheiro e Silva definem o Compliance como “o princípio de governança corporativa que tem como objetivo promover a cultura organizacional de ética, transparência e eficiência de gestão, para que todas as ações dos integrantes da empresa estejam em conformidade com a legislação, controles internos e externos, valores e princípios, além das demais regulamentações do seu seguimento”. [2]
Outra forma de compreender a governança corporativa, que considero a mais precisa, é sob o olhar do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), fundado em 1995 com o intuito de sedimentar essas boas práticas que, conforme define, “convertem princípios básicos em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para a qualidade da gestão da organização, sua longevidade e o bem comum”. [3]
Nesse cenário, o Compliance pode ser compreendido como a intenção contínua de buscar coerência entre os valores da empresa e suas práticas rotineiras. No mundo corporativo, o Compliance consiste em um conjunto de medidas que garantem o cumprimento das normas pelos colaboradores, sejam elas de origem estatal ou normas internas, independentemente do nível hierárquico, abrangendo, inclusive, os prestadores de serviços e os terceirizados.
Um Compliance Trabalhista, portanto, atrai a construção de políticas preventivas para o gerenciamento de riscos associados ao descumprimento, mesmo que eventual, das leis trabalhistas. Por isso, é importante que suas regras orientem o comportamento das pessoas de forma positiva e pragmática para beneficiar todo o ambiente corporativo. E o profissional capacitado para liderar esse processo deve ter uma combinação de habilidades bem específica.
Isso porque o Compliance exige, naturalmente, de todos os envolvidos, a capacidade de avaliar os atos internos com bom senso e clareza, sem perder a referência do certo e do errado frente às normas estatais e aos valores da organização empresarial.
Sob essa perspectiva, há que se adentrar no espírito propulsor do Compliance: a ética. Ética esta que se consolida com a prática de atos benéficos a uma coletividade e jamais para a concepção de uma vantagem pessoal. A noção de ética traz consigo a ideia de alguma coisa muito maior e mais valiosa que o interesse individual, a ponto de serem possíveis de demonstrar os benefícios que ela trará a uma coletividade. [4]
E por que o Compliance está sendo adotado no meio corporativo? Eis o porquê:
- porque é positivo atender à legislação sem se limitar ao sistema normativo, criando normas internas que nascem dos valores da empresa;
- porque facilita a elaboração de regras eficazes, éticas e flexíveis para a implantação de ferramentas de proteção interna;
- porque protege a integridade da empresa perante seus trabalhadores, fornecedores, terceirizados, parceiros comerciais, clientes e sociedade;
- porque o bom nome da empresa, e consequentemente sua marca, tem valor imensurável para a permanência no mercado e também para a sua sustentabilidade;
- porque é positivo gerenciar os riscos de passivos em todas as áreas da empresa;
- porque uniformiza procedimentos em todas as áreas da empresa para um melhor gerenciamento organizacional, pessoal e financeiro;
- porque amplia a credibilidade interna e externa da empresa e oportuniza novas chances de linhas de crédito e preferências em licitações e contratos administrativos;
- porque por meio do Compliance pode ser elaborado regras internas com força de lei e que garantirão políticas internas mais adequadas as necessidades corporativas da empresa.
Os custos de não conformidade atingem as empresas não somente por processos judiciais ou extrajudiciais, mas também por escândalos noticiados na mídia, que maculam sua reputação com forte impacto no seu valor econômico.
Diante disso, o Compliance promove uma cultura de adequação na empresa, motivando a adoção de mecanismos de proteção capazes de detectar irregularidades para efetivação de condutas corretivas. Mas os deveres empresariais advindos dos programas de Compliance não estariam limitados ao cumprimento de mandamentos legais, e muito menos em atos de “não fazer”, mas sim alinhados a uma postura ativa “perfectibilizada na instauração de um departamento de controle e vigilância eficiente, o qual, ciente dos riscos da atividade empresarial e atento ao organograma funcional por ela adotado, será o responsável por evitar e neutralizar a prática de ilícitos”. [5]
Na implantação do programa do Compliance Trabalhista, há que se seguir uma estratégia de gestão que contemple o cumprimento das normas legais e regulamentares internas com os princípios que orientam o sistema normativo trabalhista, tais como princípios constitucionais da dignidade humana, da igualdade e da não discriminação. E devem se somar, ainda, aos princípios específicos trabalhistas como o princípio tutelar, princípio da norma mais favorável ao trabalhador, princípio da condição mais benéfica ao trabalhador, princípio da irrenunciabilidade, princípio da continuidade da relação de emprego, princípio da primazia da realidade. Isso tudo e mais todos outros princípios gerais do direito, como da boa-fé e do abuso de direito.
O Direito do Trabalho tem muitas fontes: Constituição Federal, Consolidação das Leis do Trabalho, Leis especiais, Normas de Segurança e Medicina do Trabalho, Convenções Coletivas de Trabalho, Acordos Coletivos de Trabalho, entre outras.
Implementar em uma empresa uma cultura do Compliance Trabalhista exige do profissional que conheça essas fontes e as relações entre elas. É preciso uma consciência positiva de respeito não somente das normas estatais, mas também das advindas da negociação coletiva, das regulamentares do Ministério do Trabalho (atualmente incorporado ao Ministério da Economia), dos princípios gerais do direito e do direito trabalhista, e principalmente das normas internas da empresa estabelecidas pelo manto protetor do artigo 2º da CLT.
Novos elementos têm se somado a essa equação. Com a implementação da nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), as empresas serão obrigadas a desenvolver políticas de segurança da informação, políticas e notificações de privacidade, ajustar contratos e processos, manter registros de suas atividades de tratamento de dados e elaborar relatórios de impacto na proteção de dados pessoais para atividades de alto risco. A integração do Compliance digital com o Compliance trabalhista se torna relevante quando os titulares de dados pessoais e sensíveis, que são os próprios trabalhadores, estão envolvidos.
Cada um desses fatos ajuda a compreender que só por meio de um sólido programa de Compliance, em apoio à governança, a empresa garantirá a conformidade com as normas. É um caminho para evitar sanções administrativas e altas condenações, especialmente em ações coletivas no âmbito judicial, devido à falta de adequação.
Nesse contexto, a sociedade está cada vez mais se sentindo vinculada com empresas que tenham como propósito de sustentabilidade dos seus produtos e serviços práticas de conformidade legal com respeito ao meio ambiente, à dignidade da pessoa humana e à governança corporativa inclusiva e não discriminatória.
É tempo de investir no Compliance!
[1] Guia para programa de Compliance. Disponível em: <http://www.cade.gov.br/acesso-a-infromação/publicacoes-institucionais/guias_do_cade/guia-compliance-versao-oficial.pdf>. Acesso em: 20.07.2020.
[2] I. PINHEIRO, Iuri. II. SILVA, Fabricio Lima. Manual do Compliance trabalhista: teoria e prática. Bahia: Editora Jus PODIVM, 2020. p. 10.
[3] CF. IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, 2015, 5ª Edição. Código das melhores práticas de governança corporativa. Disponível em: <htpp://www.ibgc.org.br/userfiles/files/Publicacoes/publicacao-IBGC. Acesso em 16 de nov.2020.
[4] SINGER, Peter. Ética prática. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.p.18.
[5] RIOS, Rodrigo Sanchéz; MACHADO, Allian Djeyce Rodrigues. Criminalidade intraempresarial, sistemas de denunciação interna e suas repercussões na seara penal: o fenômeno do whistleblowing. RBCCRIM, n. 137, p.99, 2017.
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